Ontem recebi em meu facebook, o pedido da ativista Patrícia
Sampaio Carvalho, para publicar uma nota de repudio ao Cantor Ortinho, e ao Estado.
A nota é assinada pelos grupos Marcha das Vadias do Recife, DCE
UNICAP, Coletivo Rompendo Amarras, Movimento Zoada, Grupo Curumim, Grupo de
Teatro Loucas de Pedra Lilás, Grupo Diversidade – UNICAP, Coletivo Flores Crew,
Coletivo Ou Vai ou Racha, Najup – Núcleo de Assessoria Jurídica Popular/UFPE, Partido
Pirata do Brasil, PSol,Muda – Direito UNICAP.
O grupo ainda entrará com uma ação penal, para que os
artistas de Pernambuco percebam que este tipo de atitude não será mais
tolerada.
Pedido aceito, segue a nota:
NOTA DE REPÚDIO ÀS DECLARAÇÕES MACHISTAS DE ORTINHO
MACHISMO NÃO É ARTE; MACHISMO NÃO É PUNK
MACHISMO É O SISTEMA OPRESSOR EM SUA FACE MAIS CRUEL
No dia 20 de julho, o cantor Ortinho, durante um show no
Festival de Inverno de Garanhuns 2013, incitou seu público a só respeitarem as
mulheres grávidas e a “meter o dedo no parreco” das outras, que segundo ele,
queriam mesmo é “dar” e “foder”.
O fato repercutiu nas redes sociais e a sociedade civil
pediu uma resposta tanto do cantor quanto da Secretaria da Cultura, que
financiou o show.
A resposta veio, para maior decepção.
Em sua nota de desculpas, o cantor afirma que “o show foi
bastante aplaudido” e que “houve uma supervalorização do fato por eu ser uma
figura pública”.
Mais grave do que isso foi a nota da Secretaria de Cultura
de Pernambuco e Fundarpe, pela qual o Governo de Estado lamenta a frase dita
pelo músico e finda enaltecendo a importância da banda para a cena de rock dos
anos 90 e afirmando que a cena em que os fãs saudosos dançavam numa “roda de
pogo” [dança punk] era “muito mais importante do que qualquer frase pronunciada
por Ortinho na mesma apresentação”.
Ao cantor, ao Governo do Estado e a todos que trataram a
situação como uma “frase infeliz” que não tirou o brilho do show tão aplaudido
é necessário dizer que o cantor incidiu no delito de incitação pública à
prática de crime, previsto no art. 286 do Código Penal.
Mais grave: incidiu na incitação pública à prática de crime
de ódio, que é aquele motivado pelo preconceito e que seleciona
intencionalmente a sua vítima em razão do grupo social ao qual pertence.
Ora, Pernambuco é um dos estados da federação que bate
recordes de violência contra a mulher que não podem orgulhar a ninguém: O
Brasil ocupa o 7º lugar entre os países com de elevados níveis de feminicídio.
Pernambuco está entre os 5 estados com maior taxa de morte por agressão a
mulheres. E em Pernambuco tivemos 273 mortes de mulheres em 2011 e 207 em 2012.
Dessas mortes, cerca de metade praticada por parceiro íntimo. Como é possível,
nesse contexto, aceitar a incitação à violência contra a mulher como uma frase
menos importante do que os aplausos que o cantor recebeu?
Alegar uma roda de pogo como desculpa para diminuir o
impacto da incitação à violência contra a mulher é também uma ofensa ao
movimento punk, contra-cultural e subversivo por essência. Tampouco alegar
liberdade de expressão para erradicar a liberdade alheia pode ser chamado de
arte.
O machismo é uma das formas de opressão do ser humano mais
tradicionais e enraizadas na cultura do establishment, é uma das mais crueis
formas de imposição de força arbitrária e injusta.
E o machismo só existe porque é culturalmente aceito. Porque
ele é repetido à exaustão como algo inofensivo. Tão inofensivo a ponto de ser
menos importante do que uma roda de pogo.
Nós, mulheres, somos agredidas todos os dias pelo simples
fato de termos nascido mulheres. E enquanto houver uma cultura de tolerância e
de aceitação dessa violência, nós vamos continuar morrendo e sendo silenciadas.
Por isso, nós é que estamos “pogando” no sistema opressor,
patriarcal, machista, excludente, desumano, ao denunciarmos a brutalidade da
violência contra a mulher e ao propormos um discurso de fato contra-cultural.
E convidamos o cantor e a Secretaria de Cultura de
Pernambuco a, junto conosco, “pogar” de verdade, porque fazer pose de punk é
tão falso quanto inútil.
Diante disso, pedimos:
1) A retratação do Governo do Estado sobre a nota emitida
acerca do episódio, através da sua Secretaria de Cultura e Fundarpe,
reconhecendo que a incitação à violência contra a mulher é fato gravíssimo que
deve ser repudiado por toda a sociedade e pelo próprio Governo e que tem
importância autônoma em relação ao pretenso valor artístico do evento.
2) Que haja articulação entre a Secretaria da Mulher e a
Secretaria de Cultura, assegurado o diálogo com a sociedade civil e os
movimentos e articulações de defesa dos direitos das mulheres, para
fortalecimento das políticas públicas culturais feitas por e voltadas para a
mulher.
3) Que seja criada uma comissão especial com participação
dos diversos segmentos da sociedade civil para elaborar projeto de lei que vede
o financiamento público de produtos culturais que promovam discurso de ódio e
que promova a relação entre os direitos das mulheres e as expressões culturais.
4) Que seja firmado Termo de Ajustamento de Conduta entre a
Secretaria de Cultura e o cantor, no qual o mesmo se compromete a jamais
promover qualquer discurso de ódio contra qualquer grupo social oprimido, como
condição para que possa participar de eventos promovidos pelo poder público
estadual.
Recife e Garanhuns, 27 de julho de 2013.
Marcha das Vadias do Recife
DCE UNICAP
Coletivo Rompendo Amarras
Movimento Zoada
Grupo Curumim
Grupo de Teatro Loucas de Pedra Lilás
Grupo Diversidade - UNICAP
Coletivo Flores Crew
Coletivo Ou Vai ou Racha
Najup – Núcleo de Assessoria Jurídica Popular/UFPE
Partido Pirata do Brasil
PSol
Muda – Direito UNICAP